Entrevista com Robert Jordan

RJ1Olá, pessoal! Geralmente não traduzo entrevistas com autores, trechos ou excertos de livros, mas com o aumento da fantasia no Brasil e a nova chance da série A Roda do Tempo, através da editora Intrínseca, acho que vale a pena para os fãs de Robert Jordan (e futuros fãs) conhecerem um pouco sobre autor e os seus trabalhos.

Bem, alguns de vocês sabem que Robert Jordan nos deixou em setembro de 2007, vítima de uma rara doença. O autor participou de diversas convenções e embora seja pouco conhecido no Brasil, ele é muito conhecido na Europa, onde a série The Wheel of Time,  A Roda do Tempo em português, ainda é muito vendida.

A entrevista que vocês terão a oportunidade de ler foi dada em uma dessas convenções, na Wanderer Fantasy Convention e, de acordo com o site Theoryland, foi publicada em setembro do ano 2000 em russo, mas vocês vão reparar que o nono livro, lançado em novembro de 2000, é citado como já publicado, em uma das respostas do Jordan. Fica mais fácil compreender esse aparente erro, através do que o entrevistador Tahir Velimeev nos diz no começo da entrevista.  Quem quiser ver a entrevista original em russo, basta clicar aqui. A entrevista em inglês pode ser lida aqui e aqui.

Quanto aos indesejados spoilers, Robert Jordan faz uma observação do estilo que ele adotou no aparecimento de uma personagem. Somente quem leu o livro em questão saberá de qual se trata, pois Jordan não menciona o título. Nada sobre a trama e seu desenvolvimento nos livros da série é revelado pelo autor. Então podem ler tranquilos. Agora, se simples menção à ocasião de se colocar ou não uma personagem no livro é tido por alguns de vocês como spoiler, fica o aviso.

Fiquem com a entrevista e conheçam um pouco mais sobre o Criador Robert Jordan:

TAHIR VELIMEEV: No final de setembro do ano passado, aconteceu a quinta Convenção de Ficção Científica na Rússia, do qual participaram muitos escritores russos do gênero, críticos e simples fãs de Ficção Científica. Alguns escritores norte-americanos bem conhecidos foram convidados a participar do Congresso: Lois McMaster Bujold, Alan Dean Foster e Robert Jordan. As conversas com os dois primeiros escritores foram publicadas na Revista Ozone, mas Robert Jordan, por alguma razão, escapou dos nossos entrevistadores. Esta entrevista de alguma maneira preenche a lacuna. A entrevista contém algumas das perguntas feitas pelos leitores russos e jornalistas nos encontros com o autor bem como na coletiva de imprensa. Além disso, muito foi adquirido a partir de comunicação pessoal com Robert Jordan, incluindo perguntas via e-mail. (Participei na Wanderer como um dos membros do comitê organizador e tive a oportunidade de conversar muito com o escritor em encontros informais) Francamente, mesmo o primeiro encontro com ele causou uma grande impressão: um homem grande, alto com uma barba luxuriante, óculos escuros e chapéu de abas largas; seu andar confiante não impedido pela pesada bengala, em sua mão um vago brilho de anéis e sinetes… Uma espécie de colorida plantation sulista… 

TAHIR VELIMEEV: Estou muito feliz de me encontrar com você, caro Senhor Jordan! Bem-vindo a São Petersburgo. 

ROBERT JORDAN: Obrigado! Eu também estou feliz pela chance de visitar a sua linda cidade. Eu não estive em poucos lugares, mas esta é minha primeira vez na Rússia. Muitos obrigado aos organizadores da Wanderer Fantasy Convention que me convidaram para São Petersburgo. E meu agradecimento especial para ele pela oportunidade de visitar Peterhof e poder admirar as suas magníficas fontes. Fontes me fascinam desde quando eu era criança…

TAHIR VELIMEEV: Qual é a maneira mais apropriada de me dirigir a você?— Sr.. Robert Jordan? Ou Sr. James Rigney… Ou de outro modo?

ROBERT JORDAN: Chame-me apenas de James, como nós fazemos na América.

TAHIR VELIMEEV: Ou Robert?…

ROBERT JORDAN: Robert está bem também. Estou acostumado. Eu sou chamado assim com muita frequência nos encontros com os leitores.

TAHIR VELIMEEV: A propósito, quantos nomes tem o multifacetado James Oliver Rigney Jr?

ROBERT JORDAN: Não muitos, mas também não poucos. Sob o pseudônimo Reagan O’Neal, foram publicados os romances históricos The Fallon BloodThe Fallon Legacy e The Fallon Pride. Os eventos neles acontecem durante a Revolução Americana, nos arredores da minha cidade natal, Charleston. O nome Jackson O’Reilly está na capa do western (romance de velho oeste) Cheyenne Raiders. Nas minhas críticas de peças de teatro e dança, eu assino Chang Lung. E sob o pseudônimo Robert Jordan, foram publicados os romances da série Conan e da série The Wheel of Time.

TAHIR VELIMEEV: James, diga-nos um pouco sobre você, por favor.

ROBERT JORDAN: Eu nasci em 1948, em Charleston, Carolina do Norte, onde eu moro atualmente, em uma casa construída em 1797. Minha cidade natal é famosa por causa da Batalha de Forte Sumter, no porto de Charleston, durante a Guerra Civil entre o Norte e o Sul. Meu irmão, doze anos mais velho do que eu, incutiu em mim a apreciação por livros. E quando nossos pais o deixavam como babá, ele lia para mim, não os livros de criança, mas livros que lhe interessavam – Mark Twain, H. G. Wells, Júlio Verne. Juntamente com Twain, se tornaram meus escritores favoritos: Louis Lamor, Charles Dickens, John W. McDonald. De 1968 a 1970, eu servi o Exército.

TAHIR VELIMEEV: E até onde sei, as duas jornadas (no Exército) foram na lutando no Vietnã. Em qual posto?

ROBERT JORDAN: Eu voei em um helicóptero como fuzileiro. Eu fui Sargento e treinei os recrutas.

TAHIR VELIMEEV: Em missões, provavelmente se tornou necessário atirar?

ROBERT JORDAN: Sim…mas entenda, na missão, normalmente, você não vê pessoas — você abre fogo assim que você nota qualquer movimento e não pensa sobre aquele ser como uma pessoa. O contrário é impossível — isto é uma guerra, e os hábitos morais de um militar são diferentes dos hábitos morais de um civil: para um Comandante o objetivo principal é cumprir a sua missão e preservar os soldados. Reflexão no meio de uma luta é perigoso —voc~e será morte antes de terminar (de refletir).

TAHIR VELIMEEV: Você foi ferido?

ROBERT JORDAN:  Felizmente não…. Alguns machucados somente. Uma vez, durante uma pouso forçado, bati meus dentes na parte de trás do assento do piloto que estava na minha frente. E, em outra ocasião, fui atingido no olho por uma pequena lasca. Em princípio não senti nada, nem dor, mas em seguida, o sangue começou a fluir.  Na ocasião, a peça foi retirada com um imã.

TAHIR VELIMEEV: Por isso o Coração Púrpura em suas condecorações, certo?

ROBERT JORDAN: Não – nem ouse sugerir isso! Mas há uma Distinguished FlyingCross por serviço, uma Estrela Bronze e duas Cruzes Vietnamitas por bravura.

TAHIR VELIMEEV: Impressionante.

ROBERT JORDAN: Obrigado. Depois do serviço militar, eu entrei para a Citadel – uma Faculdade Militar da Carolina do Norte. Apesar do nome, ela é, na verdade, uma Universidade. Na Citadel eu me graduei em Física e trabalhei como Engenheiro Nuclear na Marinha. Para você, não parece um pouco estranho um autor de fantasia ter graduação em Física?

TAHIR VELIMEEV: Eu não diria isso. Conheço vários autores de ficção científica russos com graduação em ciências naturais que têm trabalhado com sucesso no gênero fantasia… A propósito, nós agora sabemos como o escritor emergiu do engenheiro.

ROBERT JORDAN: Bem, talvez exista, mais a nível prosaico – a abundância de tempo livre. Depois de um infeliz acidente, eu me vi em uma cama de hospital com bastante tempo, eu lia tudo que eu queria. E um dia, eu pensei que eu mesmo poderia tentar escrever. Tendo começado a escrever em 1977, eu estava determinado a fazê-lo até o exato dia da minha morte.

TAHIR VELIMEEV: E por que Fantasia? Por que não sobre, por exemplo, a Guerra do Vietnã, que pareceria mais lógico?

ROBERT JORDAN: Na minha opinião, fantasia te permite criar novas culturas, fazer experimentos com elas e com elas por em prática uma liberdade que é impossível no mundo real. Fantasia permite uma mais brilhante e clara descrição da luta entre o bem e o mal, te permite falar de forma mais livre sobre o que é certo e sobre o que não é, e ninguém pode dizer que sua opinião não se encaixa com o que é geralmente aceito. E eu acho que um dos princípios da fantasia é a crença que qualquer obstáculo pode ser superado e  se as coisas não funcionam hoje, elas funcionaram amanhã. No mundo da fantasia atual também se preocupa com o mito, direcionando-nos para as camadas mais profundas da alma humana e ensina às pessoas a acreditar em milagres… A popularidade desse gênero literário é, em grande parte, determinada pelos anseios dos seres humanos por Justiça…

Quantos aos livros sobre guerra… Eu tenho um desejo de escrever sobre a Guerra do Vietnã, sobre os meus companheiros, e espero que Deus me dê essa oportunidade. E por mim mesmo, decidi que esse livro será lançado com o meu nome real —James Oliver Rigney Jr. …

TAHIR VELIMEEV: Em todo caso, em 1990 um romance foi publicado e, subsequentemente, trouxe fama mundial para o autor: The Eye of the World. Um ano depois veio The Great Hunt (na Rússia, ambos trabalhos foram lançados em 1996). Desde então, leitores têm esperado e aguardado o lançamento dos novos volumes deste magnífico épico de fantasia. Eu posso dizer, sem exagero, que os fãs da sua criação estão obcecados com uma perguntinha: Quantos livros terá a série The Wheel of Time?

ROBERT JORDAN: Honestamente, eu não sei. Quando eu comecei a trabalhar cerca de quinze anos atrás, eu achei que haveria quatro ou cinco livros. Então, eu percebi que meu trabalho não caberia dentro desses limites.

TAHIR VELIMEEV: Em um site, encontrei a informação que The Wheel of Time terá dez volumes.

ROBERT JORDAN: Bem, não é verdade. Eu acho que o número será maior. Veja, cada livro é dedicado a certos eventos que ocorrem com Rand e os outros heróis da série. O enredo, claro, está sofrendo mudanças, por isso, às vezes, é necessário sacrificar algumas coisas. Os leitores atentos devem ter notado que Rand, depois de aparecer no começo dos romances, apenas volta aparecer no final dos livros… Eu acho que, para completar toda a estória, eu preciso de escrever mais três ou quatro volumes. No verão de 2000, eu terminei e entreguei para a editora TOR o mais recente livro, o nono, cujo título é Winter’s Heart, lançado em 07 de novembro. Vamos torcer para para que tenha uma edição russa em breve.

TAHIR VELIMEEV: Claro, uma das perguntas mais frequentes  —como a Saga irá terminar? E a propósito, o próprio autor sabe qual será o final dessa incrível saga?

ROBERT JORDAN: Como tudo isso vai terminar eu já sei há quinze anos — desde o momento que eu comecei a escrever o primeiro livro, The Eye of the World. Mas eu não vou revelar nenhuma intriga e nem te contar tudo com antecedência. Por que eu faria? Leia e descubra você mesmo!

TAHIR VELIMEEV: Ok, você colocará o último ponto final no livro final de The Wheel of Time, e depois?

ROBERT JORDAN: Eu tenho uma ideia para outra série de fantasia, mas os eventos não ocorreram no mundo de The Wheel of Time, mas em um universo completamente diferente. Mas eu acho um pouco cedo para falar de planos futuros…

TAHIR VELIMEEV: James, o trabalho de arte para The Eye of the WorldThe Great Hunt e todos os outros livros da série lançados foram criados pelo artista Darrell Sweet. Você viu as ilustrações criadas para seus livros publicados na Rússia? (veja as publicações russas da série aqui)

ROBERT JORDAN: Sim, o seu editor russo, Nick Naumenko, tem sido fundamental e, regularmente, me envia as publicações impressas traduzidas na Rússia. Eu realmente gostei de como isso (a edição russa) foi finalizado, e do trabalho das capas e ilustrações internas. Eu me encontrei com a Yana Ashmarin, uma das artistas e nós nos conhecemos e foi um grande prazer conversar com ela.

TAHIR VELIMEEV: Atualmente, jogos de computador baseados em obras literárias (inclusive fantasia/ficção científica) se tornaram muito populares. Por exemplo, World-ring por Larry Niven, Shannara por Terry Brooks… Os criadores de mundos virtuais já voltaram as suas atenções para a criação de algo do universo de The Wheel of Time?

ROBERT JORDAN: Até onde sei, há pouco tempo foi lançado pela Legend Entertainment Wheel of Time em RPG. O meu amigo, o escritor John M. Ford, me apresentou aos seus criadores. Incidentalmente, ele adaptou aparência de um jogo de cartas do tipo desktop similar a Magic, lançado pela companhia Precedence.

N.T.: Amigos, mil perdões, mas não faço a mínima ideia do que o querido Jordan está falando, para os rpgistas deve ser mais fácil entender, então quem conhece o assunto, faça o incrível favor de esclarecer nos comentários.

TAHIR VELIMEEV: E como vão as coisas com os produtores de cinema? Eles (os produtores) já consideraram a ideia de transformar a aquisição de direitos em uma adaptação? (nota: embora pareça estranha a pergunta, lembro a vocês que os direitos da série foram comprados pela Universal Pictures, mas até o momento não há planos para adaptação da série, seja em filme ou série de TV. Sabendo disso, a pergunta de Tahir faz mais sentido, uma vez que a aquisição de direitos não significa que um filme/série de TV será necessariamente produzido, mas espera-se que o seja.)

ROBERT JORDAN: Várias vezes, surgiu o interesse na possibilidade de adaptar os meus livros para o cinema. Um emissora de televisão até queria adquirir os direitos para criar uma série, mas eu, francamente, encarei a proposta deles com certo ceticismo. Pelo fato do livro ser repleto de eventos, a série poderia ficar muito longa… Basicamente todas as propostas têm sido a mesma coisa e podem muto bem ser fumaça no vento. O mais provável é que tenha uma animação como as feitas pelo estúdio japonês. Veremos. Teremos que esperar para ver.

TAHIR VELIMEEV: James, nos último anos, muitos escritores criaram os seus próprios sites na Internet, por exemplo, os seus colegas, Alan Foster e Lois McMaster Bujold. Tentei, mas não pude encontra o seu site, embora eu tenha encontrado muitos sites dedicados à The Wheel of Time criados pelos fãs.

ROBERT JORDAN: Eu não tenho meu próprio website! Por um lado, como você corretamente observou, existem muitos sites de fãs, e alguns deles são muito bons. Eles se saem maravilhosamente bem! Por outro lado, criar um site é fácil. Entretanto, se eu tivesse que gastar tempo, constantemente para mantê-lo, responder emails… Isso levaria muito tempo! Eu prefiro gastar tempo escrevendo alguma coisa.

TAHIR VELIMEEV: Qual conselho daria o veterano escritor para quem está tentando escrever fantasia?

ROBERT JORDAN:  O meu conselho?.. Humm… Uma vez, quando fizeram essa pergunta, eu respondi: Se você quer escrever fantasia — procure um psiquiatra!  (Sorrindo com riso evidente em sua barba.)

RJ2TAHIR VELIMEEV: James, reparei que você ama chapéus. Existe alguma razão especial? Ou é alguma coisa como um pé de coelho, um talismã de boa sorte?

ROBERT JORDAN: Não, a razão é simples. Uma vez eu coloquei um chapéu e minha esposa reparou que o chapéu ficou bem em mim. Eu os (chapéus) tenho usado desde então. Eu gosto.

TAHIR VELIMEEV: Todos os seus nove livros da série Wheel of Time têm uma dedicatória — eles são dedicados à Harriet…

ROBERT JORDAN: Sim, para minha esposa, Harriet McDougal, a luz da minha vida. Como eu, ela tem uma conexão com a Marinha — seu pai foi um almirante, e quanto à literatura, fantasia — ela trabalhou cerca de treze anos como editora na TOR. Então, ela se tornou minha primeira e mais fiel leitora e a primeira editora dos meus livros. Eu sou muito agradecido pela sua ajuda e apoio. A propósito, Sergei Berezhnoi me contou que você ,Tahir, participou da tradução para o russo de toda série Wheel of Time! Assim, de certa forma, você pode ser chamado de meu co-autor! Estou muito feliz! Deixe-me apertar a sua mão.

TAHIR VELIMEEV: Obrigado, James! Vamos ficar esperando pelos seus novos livros.

E eu espero que vocês tenham gostado da entrevista. Adorei traduzir e descobrir alguns fatos da vida do nosso mestre Jordan. Mais informações sobre a série The Wheel of Time/A Roda do Tempo já foram publicadas aqui no blog, para acessá-las basta entrar no campo pesquisar e digitar o nome da série (em inglês ou em português).

Onde você estiver, Criador, feliz aniversário!

.:.Abraços e até a próxima.:.

Sobre Cassy Teodoro

Constant Reader. SJW. Green Ajah.
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5 respostas para Entrevista com Robert Jordan

  1. Muito legal mesmo a entrevista, Cassy. Parabéns pela tradução.

  2. Terminei de ler e parabéns pela tradução! Acho que mesmo quem já leu o Olho do Mundo pode ler sem medo, não vi nada demais com spoiler

    Só me deu uma pena ver ele falando que tinha planos para outras séries ainda, tanto de Fantasia quanto sobre a Guerra do Vietnã 😦

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